Colocamos aqui um texto de Carl Rogers, ainda inédito no Brasil, que nos tem inspirado para criar nossos programas de treinamento e formação do terapeuta.
Treinando o Terapeuta
Carl R. Rogers
Se eu fosse agora criar o melhor programa que eu conheço de
treinamento de terapeutas, eu penso que incluiria todos os elementos a
seguir:
1) Primeiro, acho importante que o futuro terapeuta leia bastante –
não apenas antes do treinamento, mas também durante este
período – deve ler biografias e literaturas, tanto quanto outros
tipos de teorias psicoterápicas. Deve haver um contexto
intelectual no qual ele(a) possa se encaixar. Ler não é a parte
mais importante disto, mas eu penso que deveria estar nesta lista –
leitura, assistir filmes, qualquer maneira de adquirir estímulos. É por
isto que ir ao cinema ou ler uma boa biografia é também um bom
treinamento em psicoterapia.
2) Acho muito importante que ele(a), desde cedo, tenha
experiência em grupos de encontros (grupos intensivos) nos quais
se pode participar não importando se sinta ou não a necessidade
de ser ajudado. Você pode aprender muito ouvindo sobre os
problemas do outro e vendo como esta pessoa lida com eles.
Outra coisa de importante valor é se dar conta, perceber que
pessoas com problemas não são inferiores a você enquanto
terapeuta ou qualquer outro tipo de categoria de classe – elas
são pessoas iguais a você; assim como você tem problemas, elas
também os têm. Isto ajuda a construir uma atmosfera de
igualdade no relacionamento terapêutico. Participar de um
grupo de encontro também proporciona a oportunidade de se
observar o facilitador facilitando – de observar como eles
trabalham em grupo – e isto é um tipo de experiência
terapêutica.
3) Penso ser um fator positivo se o terapeuta em treinamento puder
fazer terapia, mas, no meu entendimento, isto deve vir quando
ele(a) sentir a necessidade. Na Universidade de Chicago, quando
eu trabalhava lá, todos procuraram terapia, penso eu, ao final de
seus treinamentos – mas foi quando eles sentiram a necessidade
de a fazer. É por isso que digo que todos podem participar de um
grupo de encontro intensivo logo de cara; penso que seria muito
bom. Terapia, entretanto, deve vir quando surgir a vontade, a
necessidade. O estagiário deve ir a um terapeuta que não seja o
seu supervisor.
4) Devem-se criar bastantes oportunidades para discussões,
experiências do tipo seminários, porque aprender com o próximo
é muito importante. E, tão cedo quanto possível, a pessoa deveria
ter experiência da prática, onde ela esteja realmente entrando
em contato com clientes. Se eu estivesse treinando terapeutas
atualmente, penso que os colocaria em contato com clientes
logo no início da formação, mas trabalhando como coterapeutas
ao lado de alguém com experiência. Penso que isto
seja uma idéia muito boa. E acredito que os clientes aceitariam –
com uma explicação de que esta pessoa pretende se tornar
terapeuta. Não me surpreenderia se um terapeuta experiente
pudesse ter dois/duas estagiário(a)s trabalhando com ele. De
qualquer forma, isto é algo que eu não tentei muitas vezes. Mas
penso que daria mais ênfase se estivesse começando um
programa de treinamento agora.
5) Suponho que o último aspecto do treinamento é compreender
que provavelmente leva uma vida inteira para se tornar um bom
terapeuta – que você não está pronto quando termina o seu
programa de treinamento. Eu estava num encontro social outra
noite e um homem que eu não via já há alguns anos veio a mim.
Ele disse: “Eu estava em seu grupo e você me supervisionou. Sabe,
levou quatro anos para eu perceber sobre o que você falava, e o
quanto isto fazia sentido”. Aquilo foi realmente interessante e
provavelmente é uma experiência muito comum – que leva um
tempo para assimilar o treinamento.
Tradução Prof. Cavalcante Jr., PhD
Referência
Rogers, C. R & Russell, D. E. (2002). Carl Rogers the quiet revolutionary: an
oral history. Roseville, CA: Penmarin Books.