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  • Foto do escritorKaroline Pereira

Mergulho no desconhecido mundo Sentir

Hoje, foi um dia de bastante atividade intelectual. Muito estudo e um grande esforço para fazer as coisas bem feitas - para não dizer perfeitas - porque ainda não aprendi a fazer o suficiente. Estava bem cansada a ponto de querer simplesmente ficar em casa, mas minha agenda insistia em me mostrar que isso não seria possível.


Pois, pronto. Lá estava eu a caminho da clínica, cansada, mas pronta para encarar o que estava por vir. Mal tive tempo de chegar e me ambientar quando o primeiro cliente chegou. Sem demora, me pus a atender.


Entro, então, no universo do outro, caminhando com cuidado e respeito. Me disponibilizando o máximo que pude, quase que instintivamente, sem mais me dar conta do cansaço antes tão presente.


Os fatos percorrem toda a sala, atravessando-me de diversas formas. E eu os deixo seguir seu caminho, da forma como querem sair para o mundo. Por um longo tempo, estou escutando fatos, mas há uma outra forma de ouvir, que não sei se posso chamar assim, talvez seja melhor dizer sentir. Fico ali, sentindo os fatos que parecem não ser mais fatos... É outra coisa. Algo que me atravessa e me faz sentir muitas coisas. Algo que passa por mim e ilumina minhas lembranças, minhas vivências. Fico ali, sendo atravessada e afetada, de forma aberta, ou o mais aberta que eu conseguir.


De repente, sinto algo emergir. Perpassa todo meu ser, uma sensação, um afetar diferente, algo que aparece diante de mim, mas que não tem forma, não tem nome. Mas que me leva a algo que parece conhecido, mas que ainda não o é. E as palavras começam a surgir, nomes, texturas, formas, algo que seja possível me aproximar daquela sensação inominável. E as palavras saem, para então afetar o outro, ou não afetar. Podem trazer significados ou simplesmente serem descartadas.


Fico nesse movimento, por vários minutos. Em alguns deles, me perco em mim, para então retornar. O tempo todo me volto para mim e para fora de mim. Hoje, eu penso ser uma coisa só, mas é a melhor forma para eu conseguir traduzir em palavras.


Hoje, tive encontros profundos. E por muito tempo - talvez não tanto tempo cronológico - fiquei diante de algo que eu não conseguia trazer no campo das palavras, mas estava lá. Eu sentia pulsar em mim! A ponto de me remexer na poltrona. Eu estava inquieta, sentindo tanto sem conseguir compreender! Sabe quando algo está diante de você, algo tão significativo, mas você não consegue se expressar a altura, porque em algum nível, você ainda não compreendeu...


Ficou em mim, se revirando, quase suplicando para existir fora... E quase como um clique, um piscar de olhos, veio! Uma lembrança! Eu já senti aquilo antes, faz parte da minha história. E eu conseguia sentir tudo, como se estivesse vivendo aquele exato momento. Mas como trazer isso para meu cliente? De que forma eu explicaria aquilo? Não havia um nome. Não é como dizer "medo", "felicidade", etc. Não havia uma palavra em mim que poderia traduzir. E então, entrei em uma reflexão interna sobre contar minha vivência ou não contar... E, ainda estava lá, pulsando, clamando para sair, estava diante de nós, sem a possibilidade de aparecer plenamente. Por fim, contei. Falei da minha lembrança.


Somos acostumados - ou talvez, treinados - para não falarmos de nós na terapia. E sofri muito, no início da minha caminhada de terapeuta, com isso. Não posso dizer nada de mim! Eu ficava me lembrando. Só que, aos poucos, compreendi o que realmente isso significava. Existe considerações a serem feitas diante disso. Eu entendo que para eu ser um terapeuta, me conhecer cada vez mais, é ESSENCIAL. ESSENCIAL MESMO.


Nesse atendimento, que eu mencionei acima, a minha vivência foi fundamental para compreender a experiência do cliente. Fundamental, mesmo! Juntas, conseguimos revelar nuances de uma experiência até então nebulosa.


Tenho me deparado cada vez mais com momentos assim. Onde algo me toca, me faz olhar para mim, para poder compreender o que do outro está me afetando. Parece nosso... E é nosso. Vem do nosso encontro, da nossa abertura, minha e do cliente, para desbravar os contornos das experiências que nos apresentam.


A magia - ou qualquer outro nome que você queira dar - acontece desse encontro, dessa abertura e dessa disposição. Muitas vezes, me sinto em outra dimensão, mesmo consciente de que estou sentada na minha clínica. É uma espécie de flutuar sem sair do chão, um mergulho no desconhecido mundo do sentir. Quando volto a superfície, me sinto revigorada, desperta. É um banho de vida que se espalha em meu ser. O cansaço ainda existe, mas transformado em algo diferente. Algo que te leva para casa, mas que te permite fazer as coisas com uma nova perspectiva.


Ser terapeuta tem me revelado uma jornada sem fim, sem contornos claros, é um caminhar adiante, sem saber bem onde vai parar. Eu sinto que não acaba. Que só revela mais e mais sobre a minha existência, sobre a nossa existência. E é, também, um grande desafio.

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